terça-feira, 2 de junho de 2009

Vidas interrompidas...

É um normal fim de tarde de primavera, e o sol esconde-se por trás de algumas nuvens... o comboio sai da estação do Rossio, por dentro do túnel... passageiros no regresso do quotidiano normal. Há sempre quem leia um livro, folheie uma revista, se perca nos olhares e no pensamento entre acordes transmitidos aos ouvidos pelos auriculares de um telemóvel ou um leitor de mp3... centenas de vidas, cruzadas num único instante. Ao longe uma criança chora, desconfortável. Mais à frente estuda-se para um teste ou um exame final. Namora-se de pé, encostados a uma porta...

... e nem tudo é o que aparenta ser... quantas vidas ali cruzadas num momento, sujeitas à força e ao poder do destino... quantas caras a esconder o sofrimento. E num repente, no instante em que o comboio deixa as entranhas da cidade para retomar a luz à saída do túnel do Rossio, um passageiro que se sente mal e desmaia... um desmaio para não mais acordar.

Confusão. Gritos. Desordem. Caos. Um travão de emergência puxado. Uma chamada de emergência ao maquinista através do sistema sonoro. Um revisor correndo para o local. A chamada para o 112... a mórbida curiosidade que impele as pessoas ao local da tragédia...

... E mais não consegui ver. Saí. Para a luz e para outro comboio que me pudesse levar ao destino, ou a uma ligação que me desse continuidade para o destino. E para trás ficaram os sentimentos mistos de pena, consternação, impotência, incredulidade... e fica-me a reflexão partilhada de um testemunhar de uma morte em directo. O findar de uma vida. O crepúsculo para uma existência, que por um momento foi partilhada, num final de tarde de Primavera, em que o sol se escondia atrás de algumas nuvens.

5 comentários:

João Roque disse...

É curioso que quando vou num transporte público, seja um combóio, seja um avião, penso variadas vezes na única sensação que se está a passar naquele momento, em que todas aquelas pessoas, apenas por uma questão casual, comungam do mesmo espaço - situações não mais repetidas, nunca mais!
E acontecer um caso assim, como o que contas, e que infelizmente, hoje em dia, já não é tão anormal como dantes, torna-nos a nós, pessoas que com ele viajávamos, entre duas estações, como que cúmplices passivos da sua partida definitiva. faz pensar, e muito, na precariedade da vida...
Abraço.

Ricardo Costa disse...

Caro amigo pinguim,

São estes momentos da vida que nos fazem muitas vezes pensar porque levamos uma existência cheia de conflitos, de maus humores, de problemas, quando a vida é tão efémera e apenas uma passagem para uma eternidade que não conhecemos e que tanto tememos...

E claro, por muito que possamos tentar evitar, situações como esta levam sempre a que de uma forma ou de outra pensemos nelas e que nos levem a pensar muito...

Abraço

Pedro disse...

Adorei o post, como já te tinha dito :)


E quero pedir-te desculpa.
desculpa.

Abraço*
p.

Ricardo Costa disse...

Caro P.

As desculpas estão aceites, e muito obrigado por teres cá vindo participar.

Daniel C.da Silva disse...

O texto, na forma, está lindíssimo.
É como dizes: de repente nao somos nada, a nao ser um grão de pó.Nao vale a pena orgulhos e sentimentos de superioridade de tantos.

Grande abraço. Foi bom descobrir o teu blog.